

Chegamos a 10a edição da newsletter e resolvi fazer uma mini retrospectiva pra reconhecer tudo que aconteceu em tão pouco tempo.
Primeiro agradecer a todos vocês que estão aqui lendo. Até o momento que dei esse post por finalizado, eram 75 assinantes. Fora quem lê e não assina, que é um número de pessoas maior ainda.
Por falar em números, o post com mais visualizações até agora é o “Onde tu te consideras um local?”. E concordo 100% com vocês. O TED da Taiye me tirou do eixo. No bom sentido. Eu lembro dele e das palavras dela todos os dias.
Além de números, queria destacar os comentários de vocês que são de longe o meu “termômetro” preferido pra continuar escrevendo. Essa semana tava conversando com uma amiga, a Mari, que também tem uma newsletter, a hello(mari)world, e falamos sobre como o comentário/feedback de alguém as vezes é mais gratificante que vender 1 milhão de livros. (E por falar em livro, essa conversa rolou dentro de uma livraria). Uma amiga, a Vera Py, que é mãe de uma amigona também, comentou sobre um dos meus posts assim: “Sempre te admirei pela tua simplicidade e ternura no teu modo de ser. E estes teus escritos espelham bem isto”. Ai meu coração.

A ideia da newsletter veio com a vontade de compartilhar com outras pessoas assuntos sobre morar fora, imigração e afins, mas também acabou me ajudandando muito. Desde então, descobri que essa inquietação sobre não pertencer à algum lugar é um sentimento compartilhado por muitas pessoas (o que eu desconfiava quando comecei a escrever, mas não sabia que eram tantas).
Aqui vão alguns dos textos nos quais me deparei desde então que me fizeram refletir ainda mais sobre o tema:
A newsletter Estrangeirismos da Lidyanne que mora na Holanda. Cada post dela é como se a IA tivesse evoluído a ponto de transcrever o que passa na minha cabeça.
“As cidades se esgotam aos poucos dentro de nós, ou passamos a embelezar esses argumentos quando queremos mudar de endereço. Ao passo que criamos hábitos e normalizamos o cotidiano, as coisas talvez percam um pouco do encanto. Quando o problema reside no indivíduo, talvez não seja tanto uma questão de localização. Repito isso em voz alta nos momentos de frustração gritante.”
Depois que li esse trecho do post “Virada de chave”, não consigo parar de pensar nisso. Por que essa inquietação constante?
Outro post que me deixou pensando sobre essa angústia foi o “Pertencimento e desarraigo”, do doses de tiquira, escrito pela Luisa Pinheiro:
“Levo seis anos completos vivendo em Curitiba. Nem eu acredito que já passou tanto tempo. Antes disso, São Paulo, São Luís, Florianópolis e São Luís. (…) Como bell hooks em cidades estadunidenses, tentei que cada uma dessas cidades fosse o meu lugar no mundo. Pra ser sincera, eu ainda não sei se Curitiba é esse lugar. Tenho uma tendência pessimista de acreditar que esse lugar nem existe mais. Melhor me aquietar do que passar a vida toda procurando. Nem sei se acredito no que acabei de escrever.”
Também não sei se acredito.
Tem também a newsletter da Vanessa Guedes, especificamente o post “Da palavra ao abismo”.
“Aprender uma língua estrangeira é cair em queda livre. Há de se preparar para o impacto do invisível nos aguardando lá embaixo. Às vezes é um chão duro e seco, onde rachamos o crânio e morremos na hora. Outras vezes, é um lago profundo cujas águas nos salvam em um abraço. Um abraço sufocante, mas ainda sim, um abraço. Com o tempo, aprendemos a cair graciosamente. Como um atleta de salto em água. (…)
O português é um conjunto invisível de escudo, armadura e espada. Você não está vendo, mas está usando todo esse aparato enquanto vive em português. Arriscar qualquer outra língua é se despir desse aparato e ficar vulnerável. Dependendo da distância do idioma, é a sensação de estar nu.
Porém, a vulnerabilidade também é um super-poder. Não um poder externo, que a gente usa sobre as pessoas e o mundo. Mas um poder interno, que nos faz pessoas mais atentas, mais frágeis e, por isso mesmo, mais maleáveis e dispostas a nascer em um lugar novo, abrir-se para criar uma nova armadura, um novo escudo e uma nova espada.”
Os textos da Vanessa são de uma sensibilidade e subjetividade incríveis. Me ajudam a entender o impacto das experiências de morar fora em mim mesma.
E não foi só nesse post que a Vanessa me deixou divagando sobre falar uma nova língua. Tem o Imigração: o silêncio da língua.
“Hoje, durante uma aula de literatura árabe, ministrada em inglês, eu escutei dois colegas cochichando atrás de mim e estranhei. As palavras escorreram direto para o coração do ouvido, sem obstáculos, sem aquela característica truncada e ruidosa com que chegam as línguas estrangeiras, que são como uma visão borrada do outro lado de um vidro embaçado. Falavam português. Será? Escutei com mais atenção e percebi que não. Falavam sueco. E o mais extraordinário: eu não conhecia exatamente todas as expressões que eles usavam, mas ainda sim, a língua escorreu macia para dentro de mim e eu entendi tudo.”
Não consigo me lembrar quando foi a primeira vez que uma conversa em inglês “escorreu direto para o meu coração”, mas lembro de várias situações nas quais me deparei frustrada com a minha “visão borrada” por não entender o inglês. (Nota mental: dar mais valor para minhas conquistas).
“Quando me mudei para cá, eu sabia muito pouco inglês, conseguia ler e tal, mas conversar era um suplício. De algum jeito eu consegui um emprego, e depois outro, e outro, e nos primeiros 2 anos morando aqui eu chegava em casa com uma tremenda dor de cabeça todos os dias. Era o preço da vida bilíngue.”
Nossa, cansei de ir embora do trabalho torcendo pra o motorista do Uber não puxar assunto porque não aguentava mais interagir em inglês. Teve um dia que deixei escapar o português com meus colegas de trabalho, imagino porque meu cérebro já pedia socorro. (Imaginem a cara deles depois de um dia cansativo resolvendo perrengue também).
E pra terminar. Desde que voltei do Brasil e deixei o livro da Rita Lee, estive numa batalha pra encontrar um livro que eu gostasse de ler. (Logo eu que tenho uma lista infinita de livros na fila). Tinham três na minha cabeceira que tentei algumas vezes continuar lendo, mas não conseguia. Até que me deparei com o livro do Mohsin Hamid, Exit West. Eu ainda não terminei de ler ele, mas tudo indica que vai ser rápido. Vou deixar aqui a parte que mais mexeu comigo por enquanto.
“Everyone migrates, even if we stay in the same houses our whole lives, because we can’t help it. We are all migrants through time.”
Minha tradução: Todo mundo migra, mesmo se ficarmos na mesma casa nossa vida inteira, porque não podemos evitar. Somos todos migrantes através do tempo.
Desejo a todas uma ótima Páscoa e um bom feriado! Por aqui, folga só no final de semana.
Agora que chegamos ao fim, posso fazer uma enquete baseada no que comentei por último na newsletter?
Eu não suporto continuar lendo um livro que não tô gostando, mas algumas pessoas ao meu redor gostam de insistir. Que tipo de pessoa tu és?
Obrigada por chegar até aqui! Se gostastes do que leu, não esquece de curtir, comentar e compartilhar com alguém que possa gostar também.
fico muito contente que o texto sobre pertencimento ainda esteja circulando por aí. obrigada pela leitura, de verdade <3 esse é um tema que eu preciso me controlar pra não abordar em todo santo texto que escrevo. acho que penso no assunto todos os dias... sem exagero rs
te contar que eu adorei o teu texto sobre os lugares em que nos consideramos locais, nunca tinha ouvido falar dessa ideia, agora tenho mais o que pensar... veja só. e fiquei muito curiosa com o feijão temperado com merkén que tu menciona em outra edição. eu morei no chile um tempinho e usava merkén em tudooooo, mas naquela época não era de fazer muito feijão. vou ver se encontro merkén aqui em curitiba!
que honra!
adorei conhecer aqui. vida longa a push a porta (que nome maravilhoso) 🩷